Crocodilagem - Rango
Edgar Vasques
RESENHA

Edgar Vasques nos presenteia com "Crocodilagem - Rango", um fenômeno de expressividade e crítica social num livro gráfico de apenas 80 páginas. Provando que a concisão pode ser tão ou mais poderosa do que extensos tratados, Vasques revela o que de fato importa: um vislumbre cruel e hilário do absurdo cotidiano.
Aqui, encontramos Rango, o personagem icônico criado por Vasques nos anos 70, e imortalizado em tirinhas que, por vezes, são como farpas cravadas nas injustiças e idiossincrasias do Brasil. As ilustrações mordazes escancararam décadas de politicagem e hipocrisia, em que cada página é um espelho distorcido do Brasil. Ao mesmo tempo em que nos faz rir, nos obriga a confrontar a crua realidade sociopolítica.
Quando nos deparamos com personagens famintos, vemos nosso próprio reflexo. Somos tragados por um mar de indignação e melancolia, misturados com brilhos de humor ácido. Vasques é hábil em capturar a tragédia brasileira com traços minimalistas, cada linha do seu desenho carrega toneladas de frustração e resistência. Foi um ícone em tempos de censura feroz e ainda ressoa como um grito sussurrado em plena era da informação.
O contexto histórico em que cada tirinha foi criada não pode ser separado da leitura. Tal como um vinho raro, sabemos que a fermentação social é a principal responsável por seu sabor se manter. Vasques começou sua obra em um regime militar draconiano, mas seu poder persiste e reverbera em períodos subsequentes de "democracia" (se é que podemos chamar assim), lembrando que nem sempre a liberdade de expressão foi um direito corriqueiro ⛓️.
"Crocodilagem - Rango" é uma obra que não apenas estampa a arte autoexplicativa de sua época, mas arrebenta nos detalhes escondidos nas profundezas das cenas. Cada leitura traz novas camadas de implicações e provocações. Vasques não perdoa, não mitiga. Ele nos força a digerir a dura realidade como Rango digere seu nada. É um choque de realidade fino, sutil, porém ruidoso em sua essência.
Alguns leitores se revelam encantados com a atualidade mordaz das caricaturas. Em fóruns de discutem, quase sempre bem-humorados, encontramos aqueles cujas identidades políticas destrincham a leitura pelos poros 👀. Outros, os que o criticam por sua "lentidão em oferecer soluções", são apenas aqueles que ainda não entenderam que a principal arma de Vasques é a denúncia.
Comentários contrários à obra, assim como a abrasividade ecgariana, não passam ilesos. Os que ousam diminuí-la são os que apresentam uma insensibilidade irritada diante de quem lhes aponta suas próprias fraquezas. É impossível ler "Crocodilagem - Rango" sem sentir o espinho incômodo de um artista inconformado.
Vasques é realismo exagerado, um telado de pinceladas cruas que te agarra, mesmo sem querer. "Crocodilagem - Rango" não só evoca o peso de sua trajetória durante regimes opressores como atira seu desdém ácido nas mazelas políticas de então e de agora. Ele desafia uma mentalidade cômoda ___ te convoca a sair da passividade e entrar na roda!
Resposta fácil e banho de água morna são a antítese de Vasques. Portanto, prepare-se; ou melhor, este seu "preparo" tornou-se obsoleto após esta criação. Coloque este livro em um altar, abra suas páginas, deixe que desentorte suas noções pacatas sobre sociedade, política, fome e arte.
Assim é "Crocodilagem - Rango" de Edgar Vasques. Uma viagem pelas linhas tortas do Brasil, guiados à força por uma das mãos mais contundentes da ilustração e sátira moderna. Seja corajoso ao lê-lo; apenas a coragem tornará a imóvel as vísceras que ele insiste em revirar.
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📖 Crocodilagem - Rango
✍ by Edgar Vasques
🧾 80 páginas
2018
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